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A Constituição e os governos não enfrentaram com firmeza os problemas do longo prazo

 
 
18/08/15 – Carta Capital
A Constituição e os governos não enfrentaram com firmeza os problemas do longo prazo
dilma-rousseff

A situação se complica quando, depois de uma eleição, os próprios eleitores se desiludem. Foi o que aconteceu com a presidenta Dilma, que tem hoje o apoio de apenas 9% do eleitorado.

O regime de economia de mercado, com propriedade privada e separação entre os que vendem a sua força de trabalho (trabalho “vivo”) aos que puderam acumular capital (trabalho “morto” cristalizado), que lhe aumenta a produtividade, revela historicamente flutuações cíclicas (de períodos e amplitudes diferentes), produzidas pela variação do psiquismo que controla o comportamento do setor privado. Elas são, normalmente, corrigidas por uma manipulação da política econômica. É exatamente a confiança na qualidade, agilidade e determinação com que se põe a trabalhar o governo que determina o tempo de duração e a profundidade da flutuação.

O regime, que chamamos de capitalismo, tem graves defeitos, mas de longe é o mais amigável “descoberto” pelo homem até agora, para possibilitar um razoável grau de liberdade de iniciativa individual com uma necessária amplificação da igualdade de oportunidades, acompanhadas de relativa eficiência produtiva. Não é uma coisa. É um processo evolutivo cujo funcionamento depende da ação inteligente de um governo limitado constitucionalmente, mas forte o suficiente para controlar a tendência natural da formação do poder econômico e garantir o aperfeiçoamento do sufrágio universal. É esse que, periodicamente, o submete ao empoderamento crescente da sociedade. Governo controlado, mercados regulados para estimular a competição, eleições livres e periódicas e paciência para não se deixar enganar com curtos-circuitos, parece ser a receita mínima para a construção da sociedade civilizada.

Há, entretanto, crises muito mais severas do que as endógenas, isto é, produzidas pelo próprio comportamento cíclico, do setor privado no capitalismo. São aquelas em que se mergulha quando o próprio poder incumbente recusa as restrições físicas a que está sujeita a economia e envereda, por miopia política, na feitiçaria econômica portadora da “salvação nacional”. Quando a realidade escondida pelo marketing mágico desce à terra, a confiança desaparece como por encanto. A situação é ainda mais complicada quando, depois de uma eleição, se desiludem os próprios eleitores. Foi o que aconteceu com a presidenta Dilma. Ela foi eleita por pouco mais de um terço do eleitorado. Saiu legitimamente eleita com o voto contrário de um pouco menos de dois terços dos eleitores. Quando teve de enfrentar a verdade da tragédia fiscal de 2014, não a reconheceu explicitamente, mas teve a coragem de fazer uma apropriação da política econômica recomendada por seu adversário. O resultado da manobra foi trágico. Não conseguiu recuperar um voto dos que lhe haviam recusado o seu apoio e perdeu a confiança de pouco menos de dois terços do seu eleitorado original. Tem hoje o apoio de apenas 9% do eleitorado.

Há alguma coisa sinistra e injusta nesses fatos. A aceleração do desequilíbrio geral em 2014 apenas antecipou o desastre fiscal anunciado há 27 anos. Tem sido construído desde sempre pelo laxismo com que se trata. 1. A preparação pouco crítica do Orçamento. 2. As reservas de mercado para certos dispêndios com vinculações desde a Constituição de 1988, elas mesmas resultado da falta de confiança da sociedade nos administradores públicos. 3. A insistência em indexações. 4. A facilidade com que se transformou dívida pública em “novos” recursos etc. A grande verdade é que nem a Constituição nem os governos (nem mesmo FHC, com o magnífico Plano Real e a excelente Lei de Responsabilidade Fiscal) enfrentaram, com determinação e firmeza, os problemas do longo prazo.

Não é preciso ser um economista quântico para explicar o desastre que explodiu no colo da presidenta Dilma, ainda que, recentemente, ela o tenha cultivado. Basta dizer que a carga fiscal bruta cresceu de 28% do PIB em 1994, no governo Itamar, quando o ministro fez um superávit primário de 5,6% e a relação dívida bruta/PIB terminou em 40% do PIB, para 36,2% do PIB em 2014, quando foi feito um déficit primário de 0,6% do PIB e a relação dívida bruta/PIB atingiu 59% do PIB.

É preciso criar, de verdade, uma perspectiva crível de que serão propostas e aprovadas medidas eficazes para mudar o rumo do crescimento endógeno das despesas correntes. E isso só se fará com um entendimento entre o governo e a sua bancada no Congresso.

em 17/08/2015

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